Conheça a história de um dos maiores cineastras brasileiros
Uma das histórias mais marcantes que já ouvi, e com certeza serviu muito para meu aprendizado acadêmico e pessoal. Estive presente na casa de um dos maiores cineastas brasileiros. Carlos Scalla, nascido em 1954 na cidade de Muriaé-MG, começou sua trajetória no cinema em 1968, quando tinha apenas 14 anos de idade. Um homem que mesmo com poucos recursos e morando no interior conseguiu iniciar uma linda trajetória no cinema.
Tudo começou quando tinha 12 anos de idade, apareceu uma oportunidade para Scalla trabalhar no cinema da cidade de graça, em troca ele podia assistir os filmes. O gosto por fazer filmes foi tamanho que 2 anos mais tarde trocou sua bicicleta por uma câmera. Em seguida, gravou seu primeiro filme, “Lei Sangrenta”. O filme foi gravado nas margens do rio Muriaé, próximo ao Dornelas, onde era perceptível uma outra vista, bem diferente da atual. Imagine o rio limpo, extenso e com florestas ao seu redor. Foi nessas paisagens que foi gravado.
Para participar do filme, os atores tinham que ajudar a arcar com as despesas que não era fácil. Depois de gravado o “Lei Sangrenta”, tinha outro desafio, revelar o filme. Imediatamente Scalla sem conhecer muito bem a máquina que tinha, viajou ao Rio de Janeiro com a ajuda de um vereador daquela época. Vanderly Torres levou o adolescente cineasta para revelar o filme. “ Eu me lembro que o vendedor começou a me perguntar coisas que eu ainda não entendia, tive que aprender tudo cedo sem a ajuda de ninguém para gravar outros filmes”.
Desde então Scalla não parou mais. Ná década de 70 existia o cine jornalismo em Muriaé, eram notícias da cidade que passavam no cinema, um sucesso total.
Nesse período sua história já repercutia nas grandes universidades de cinema do Brasil. Em 1999 um professor da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) conheceu Scalla e produziu um documentário contando sobre sua vida. Um menino que trocou a bicicleta pelo seu sonho.
“Comecei a fazer Cinema com 14 anos, sem interesse financeiro, por que o cinema é Lúdico” Afirma Scalla.
Em 2002, a Jornalista e cineasta Mary Rodrigues depois de um bate-papo de mais de 6 horas com Scalla iniciu um desafio, agora não mais em documentário, produzir um filme contando sua história nos mínimos detalhes. Um projeto todo gravado em Muriaé, com um investimento de 300 mil reais. Ainda em 2002 foi lançado o filme “ Cinema, uma paixão”. O filme contou com um grande elenco como Paulo Cezar Grande, Claudia Mauro, dentre outros grandes atores de renome nacional, além da estréia de Bruno Benec, ator muriaeense que depois desse trabalho não parou mais na carreira artística.
Seus projetos
Mesmo sendo um dos cineastas mais respeitados no Brasil, em Muriaé, sua cidade natal, seus trabalhos ainda passam despercebidos pela população, tudo devido a falta de incentivo a cultura cinematográfica.
Estive em sua residência e pude perceber desde a minha entrada muito mais do que uma simples casa, um local onde quem entra não sai da mesma maneira.
Carlos Scalla preserva equipamentos de cinema usados na decada de 60, mas uma de suas maiores relíquias são o cinematógrafo feito pelos irmãos Lumiére de 1898. Único cinematógrafo no Brasil dessa época em funcionamento. Outra relíquia que ele possui é o conjunto cinematógrafo Pathe Baby, 9,5mm, fabricado em 1922, primeiro equipamento utilizado pelo cineasta Humberto Mauro, na cidade de Cataguases-MG, no curta “Valadião, o cratera”, em 1925.
Devido a tantos materiais raros de se encontrar e pela vasta experiência no cinema, Carlos Scalla nos últimos anos está sendo convidado com freqüência para ministrar palestras e oficinas por todo Brasil. Recentemente ele esteve presente no festival de cinema em Mariana-MG organizado pela UFOP (Universidade Federal de Ouro Preto).
O despertar de estudantes universitários e professores pelos trabalhos de Scalla levou muitos a conhecerem pessoalmente suas relíquias e sua história. Já recebeu estudantes da UFMG, UFJV, Estácio, Universo e até mesmo da UFB (niversidade Federal da Bahia). Recentemente Scalla e seu filho Bruno Scalla foram convidados para ministrarem uma palestra na Universidade Federal de Maceió-AL.
Mesmo com tanta história, mais de 300 trabalhos produzidos, Scalla tem muitos objetivos pela frente. Juntamente com seu filho Bruno eles pretendem deixar por muito tempo a história do cinema viva na memória das pessoas. A meta é fundar o primeiro museu cinematográfico de Muriaé em parceria com leis de incentivo a cultura e empresas privadas, onde as pessoas possam conhecer melhor seus equipamentos e assistirem os mais diversos filmes e documentários. Um projeto inovador, sem dúvida contribuirá ainda mais para a história de Muriaé e do Cinema brasileiro. Quando perguntei a ele de onde vem tanta inspiração para produzir filmes, ele me disse; “Não sei. Existem aquela sambista da comunidade que já nasce sambando maravilhosamente, e existe também a dançarina profissional, que faz aula de dança, mas não consegue sambar como a sambista da comunidade”.